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Pastoras evangélicas se unem para combater violência contra as mulheres nas igrejas

A iniciativa visa promover a sensibilização dos líderes das igrejas sobre o tema, além de capacitar as vítimas que não possuem independência financeira.

Um grupo de pastoras evangélicas de diferentes denominações protestantes se uniu para debater ações práticas de combate à violência contra as mulheres dentro das igrejas.

A iniciativa visa promover a sensibilização dos líderes das igrejas sobre o tema, além de capacitar as vítimas que não possuem independência financeira.

O projeto foi elaborado há quase seis meses e será colocado em prática agora. As igrejas que aderirem à proposta ganharão um selo especial: o “Viver em Paz“.

Segundo a líder da Igreja Batista Evangélica de Vitória do Espírito Santo (IBEV—ES), Andreia Bolzan,o grupo é composto por 20 pastoras pertencentes a mais de 15 denominações protestantes diferentes, entre pentecostais, não-pentecostais e neo-pentecostais.

As líderes enfrentarão um tema que ainda hoje é considerado um tabu dentro das igrejas. “São mulheres corajosas que se levantaram para dizer que existe sim o problema da violência contra a mulher no meio cristão. Não deveria existir e queremos acabar com isso”, destacou.

Pastoras evangélicas se reúnem na igreja para discutir a violência contra as mulheres

Violência contra as mulheres

Apesar da carência de informações por parte do estado, um levantamento sobre o assunto promovido pela Casa Sofia (espaço de atendimento para as mulheres alvos de violência em São Paulo) revelou que 40% das mulheres atendidas declararam serem evangélicas. No Brasil, estima-se que 30% da população seja protestante.

A escritora e socióloga Valéria Cristina Vilhena, doutora em Educação, História e Cultura, mestre em Ciências da Religião, autora do estudo, afirma que trabalhos deste tipo demonstram o reconhecimento de que as mulheres evangélicas não estão isentas da violência, pelo contrário.

Infelizmente, há muitos casos e depoimentos coletados que mostram que elas são orientadas por líderes a permanecerem no casamento, mesmo sendo alvos das mais variadas formas de violência, inclusive a física.

“[Um pastor] Orientou uma mulher a ter mais paciência, a aprender a lidar com o marido. Aquela mulher decidiu que nunca mais buscaria ajuda do pastor. Terminou se separando, mas não abandonou a igreja. O exercício da fé a mantinha forte, mas preferia sentar no último banco da igreja”, contou Valéria.

Casos de feminicídio são crônicos

O feminicídio, isto é, o assassinato praticado contra a mulher em decorrência do fato de ela ser mulher ou em decorrência de violência doméstica, apresenta números preocupantes: 21 mulheres foram vítimas fatais neste ano. No ano passado, foram 33 casos.

Outra informação que escancara o problema é o número de boletins de ocorrência referentes a qualquer tipo de violência praticada contra a mulheres que foram registrados nos últimos sete meses: 42 por dia.

Cientes do desafio a ser encarado pela frente, as próprias lideranças femininas buscam renovar a estrutura de poder das igrejas baseada em alguns conceitos. Um deles é o casamento indissolúvel — quando não se aceita o divórcio — , o perdão e a resiliência em relação aos problemas do casamento, e que elas avaliam estarem sendo mal interpretados.

“Existe uma falsa interpretação que bloqueia o entendimento das pessoas sobre o tema. É como se fosse pecado”, destaca Andreia Bolzan, líder da Igreja Batista Evangélica de Vitória do Espírito Santo (IBEV—ES).

Ela enfatiza que professar a fé não impede de maneira alguma uma mulher denunciar o seu agressor.

Pastoras evangélicas se reúnem na igreja para discutir a violência contra as mulheres

O papel da igreja

A coordenadora de base do Ministério Bálsamo Gileade, Iara Rocha, em Campo Grande, afirma que o projeto retoma um papel que é da própria igreja. “A igreja tem o papel de olhar, de cuidar do indivíduo”.  A proposta de Iara não se restringe a balançar uma bandeira de combate à violência contra a mulher.

“Não é apenas isso, queremos ajudar no resgate da verdadeira identidade da mulher, sensibilizando o homem de que eles não foram criados desconectados. São papéis conectados, e eles precisam atuar nestas identidades. E caminho de volta para estas identidades”, assinala.

De início, será necessário sensibilizar e conscientizar os pastores, líderes de cada uma das igrejas evangélicas. “Eles precisam ser ouvidos, precisam receber o projeto, e nos autorizar a estar em diferentes reuniões, fazendo ações especificas para homens, para os agressores, para as mulheres, para as vítimas”, conta.

É importante também orientar não somente os líderes, mas a própria comunidade de cada igreja sobre as etapas da violência contra a mulher, e que ela não corresponde apenas as situações de agressões físicas. “Há também a violência emocional, psicológica, moral, patrimonial. E será preciso sensibilizar, ensinar, orientar e ajudar estas pessoas na prevenção e na correção dos fatos, para mudarmos esta realidade. Há situações em que muitos desconhecem até os instrumentos que já existem”, pondera Iara.

O projeto

Simbolicamente, o projeto teve início no dia 8 de março deste ano, Dia Internacional da Mulher, em uma reunião das pastoras e líderes de igrejas com a vice—governadora Jaqueline Moraes.

“Seis meses após esta reunião elas apresentaram o projeto, um trabalho pioneiro, sem placas, que surgiu da união de mulheres que tem se posicionado por não silenciar diante da violência contra a mulher”, assinalou a vice-governadora, que também é evangélica há quase 30 anos.

Haverá dificuldades, segundo Jaqueline, como em qualquer outro segmento social. “As dificuldades existem em todas as camadas sociais. Mas a vantagem é que teremos no meio evangélico mulheres capacitadas a nos ajudar na reeducação social, que permitirá homens e mulheres a viverem com respeito e igualdade”, pontua.

O grupo visa promover, nas igrejas evangélicas, alguns tipos de ações, tais como:

  • Sensibilizar os pastores, líderes das igrejas, a se comprometerem com o projeto
  • Criar um selo “Viver em Paz?’ para as igrejas que adotarem o projeto
  • Criar multiplicadores nas igrejas para o trabalho de orientação e conscientização
  • Criar rodas de conversa sobre o tema
  • Realizar palestras de prevenção para crianças, adolescentes, jovens, mulheres e homens
  • Atuar na identificação da profissionalização das mulheres, ajudando—as na busca de independência financeira
  • Oferecer ou orientar sobre como obter apoio para as questões emocionais
  • Capacitar as instituições e membros da comunidade para lidar com o tema
  • Realizar, mais a frente, pesquisa no meio evangélico sobre o tema
  • Criar uma campanha de incentivo ã denúncia, por vizinhos e familiares, além das vítimas

Fé-ministas

Quem desenvolveu a base para o projeto “Viver em Paz” é Valéria Cristina Vilhena. Ela é autora de um livro lançado em 2009, “Uma Igreja Sem Voz”, pilar da fundação do grupo “Evangélicas pela igualdade de gênero”.

O coletivo de mulheres é formado por diversas denominações, que discutem regularmente o tema. O grupo ganhou o apelido de Fé-ministas.

Fonte: Gazeta Online/Fotos: Reprodução/Felipe Ventura




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