No nosso quadro de entrevistas de hoje ( Da série empreendedorismo emergente), vamos contar com a participação da odontóloga Dra. Jacyara Soares, que faz parte do atendimento na rede pública de Ji-Paraná, atuando como cirurgiã dentista e odontopediatria. Nesse bate papo descontraído, selamos não só uma amizade,como também a sua participação em uma coluna voltada somente para assuntos relacionados a saúde bucal.
1- Conexão Amazônia: Dra Jacyara é difícil ainda hoje ter acesso a um bom tratamento odontológico?
Dra. Jacyara: No Brasil temos a maior concentração de dentistas do mundo, segundo levantamento realizado pelo IBGE. Ao todo são 547.566 profissionais ativos, envolvendo todas as especialidades, espalhados pelo país sendo que cerca de 70% desses dentistas estão nas regiões sul e sudeste. Mas esses números não refletem a realidade do cuidado com a saúde bucal dos brasileiros. É que a grande maioria desses serviços, cerca de 80%, é prestada pelo serviço privado que responde por boa parcela do acesso aos serviços de saúde bucal. Além disso, o mercado é altamente saturado nas regiões metropolitanas, o que causa um déficit na oferta de tratamento para populações mais carentes e que vivem afastadas dos grandes centros urbanos. Uma pesquisa realizada pelo Conselho Federal de Odontologia indicou que 46% dos brasileiros consideram difícil o acesso ao dentista, outros 20% disseram que não costumam ir ao consultório – dentre os principais motivos está a falta de condições financeiras, principalmente entre as classes mais baixas da população.
Podemos citar outros fatores que dificultam o acesso aos cuidados odontológicos, como a acessibilidade geográfica, a acessibilidade cultural e acessibilidade funcional. Os fatores sociodemográficos, percepção da necessidade, bem como as crenças e a importância atribuída a saúde bucal mostram forte influência sobre a utilização dos serviços de odontologia.
2. Conexão Amazônia: O que você acha mais complicado, educar a população para os cuidados necessários com os dentes, ou o acesso eficaz pela rede pública de um bom tratamento?
Dra. Jacyara: No campo de prestação de serviços odontológicos no Brasil ainda vigora a prática curativa, que é o tratamento das doenças bucais quando já estão instaladas. No entanto, a rede pública deve garantir não só o acesso ao tratamento odontológico, mas também realizar toda a parte de prevenção. O objetivo da odontologia preventiva é evitar o aparecimento das doenças bucais ao invés de focar exclusivamente o tratamento das doenças nos pacientes. A prevenção é a prática de manter os dentes e gengivas limpos e saudáveis para evitar problemas dentários como tártaro, gengivite, periodontite e cáries e também ajuda aumentando a vida útil dos tratamentos bucais já realizados. A educação dos pacientes é um dos pilares mais importantes da prevenção, sendo esse o meio mais eficaz e de baixo custo que irá garantir a saúde bucal dos brasileiros.Os Programa do governo federal como Saúde da Família ou Saúde nas Escolas se utilizam dos preceitos da odontologia preventiva. Desde a implantação do programa Brasil Sorridente em 2003, o Brasil contou com uma diminuição significativa nos casos de cáries dentárias. Esses resultados são porque por meio de uma equipe multidisciplinar os profissionais da saúde acabam levando orientações para uma faixa da população que antes não tinha o hábito de consultas regulares para avaliar sua saúde. Nesses programas, as orientações são essenciais e com o foco na prevenção de doenças. Quando falamos de odontologia preventiva as orientações são essenciais. No caso dos programas citados acima, as famílias e as crianças nas escolas tem um contato frequente com as equipes de saúde básica. Essa frequência é benéfica já que os profissionais da saúde têm mais chances de abordar sobre os cuidados para a prevenção. A repetição é essencial para o aprendizado das boas práticas e cuidados básicos da saúde bucal. Nesses casos, as pessoas que estão sendo ‘educadas’ quanto a odontologia preventiva passam a atuar como agentes multiplicadores da informação apreendida. O que virá em benefício e diminuirá os índices de doenças bucais. Podemos concluir que é muito mais fácil a população se conscientizar da importância da prevenção através também da educação, a fim de evitar as cáries dentárias, doenças periodontais, como a gengivite e a periodontite, e até mesmo o câncer bucal do que ter acesso ao tratamento odontológico curativo oferecido pelo sistema público de saúde.
3- Conexão Amazônia: Hoje quais os métodos mais utilizados na rede pública para tratamento odontológico?
Dra. Jacyara: No Brasil a configuração de um sistema público de atenção à saúde bucal foi feito através do programa Brasil Sorridente, política formalizada em 2004, expressou um conjunto de diretrizes e articulação de ações de saúde bucal no Sistema Único de Saúde (SUS), com foco na qualificação e ampliação da atenção primária e especializada. A atenção especializada conta com os Centros de Especialidades Odontológicas, os CEOs.Os Centros de Especialidades Odontológicas (CEO) são unidades de saúde destinadas ao atendimento odontológico especializado no âmbito do Sistema Único de Saúde, devendo realizar as seguintes atividades: diagnóstico bucal, com ênfase no diagnóstico e detecção do câncer bucal; periodontia especializada; cirurgia oral menor dos tecidos moles e duros; endodontia; e atendimento a portadores de necessidades especiais. Na atenção primária, o cirurgião dentista foi incluído no programa do PSF, fazendo o atendimento nos postos de saúde, integrados às equipes de saúde. Também são realizados os mesmos procedimentos, num nível de complexidade menor. Realizam também os programas de prevenção. No município de Ji-Paraná, temos quatro postos de saúde onde encontramos atendimento odontológico na rede básica. No Centro de Especialidades Odontológicas de Ji-Paraná são realizados procedimentos como, por exemplo, restaurações, exodontias (extração de dentes), Odontopediatria, Endodontia e atendimento a pacientes com deficiência.
4- Conexão Amazônia: No atendimento particular de algumas clínicas, geralmente os orçamentos ficam bem caros, porque isso ocorre?
Dra. Jacyara: Quando dizemos que dentista cobra caro, é um assunto que incomoda tanto pacientes como os dentistas. Mas assim como advogados, médicos, psicólogos, fisioterapeutas e outros profissionais liberais, o dentista está inserido no conceito de livre mercado que nos é imposto pelo modelo econômico em que vivemos. Há um grande empreendedorismo envolvido neste setor, como, por exemplo, uma alta carga tributária, uma grande variedade de materiais dentários, equipamentos odontológicos e recursos que adquirimos, o custo contínuo da formação e atualização profissional, os gastos para a manutenção do estabelecimentos. São recursos com um alto custo para o profissional, encarecendo o tratamento odontológico, sem dúvida. No entanto, o que de fato pode ser considerado “caro” na área da Odontologia são os tratamentos estéticos, mas a especialidade não os considera necessidade básica para ter uma excelente saúde bucal. Os procedimentos mais caros são os clareamentos, as facetas de porcelana, coroas de porcelana e etc. Eles servem mais para o paciente se sentir bem do que propriamente para manter a saúde oral. Também temos que levar em consideração dados do Conselho Federal de Odontologia que indicaram que grande parte dos brasileiros não vão ao dentista por falta de dinheiro. Esse dado levanta uma questão interessante: é realmente muito caro cuidar da saúde bucal ou não temos uma Economia que nos garanta recursos financeiros para se ter o básico, como a saúde, por exemplo? Lembrando que adiar a ida ao dentista, ao acusar o mínimo sintoma, pode encarecer o tratamento pelo crescimento de demanda relativa ao agravamento do quadro não tratado na hora em que surge. Uma dica valiosa: investir em consultas periódicas é sinônimo de economia já que previne doenças mais graves que pedem tratamentos mais custosos. Prevenir custa bem menos que tratar. Participar de um programa de prevenção é garantia de se ter excelente saúde bucal gastando pouco. Os procedimentos para a recuperação de uma má saúde oral são muito mais caros do que os que existem para preveni-los. O empenho do paciente na prática dos cuidados bucais recomendados pelo dentista, como, por exemplo, uma adequada higiene bucal é muito importante. Esse é o segredo do sucesso de qualquer tratamento e da prevenção para futuros problemas. E, para concluir, de modo geral, a diferença entre preço cobrado em diversas clínicas, está relacionada na maioria das vezes com a qualidade do material odontológico utilizado, com a qualificação e experiência do profissional, se é especialista ou não, com a localização da clínica e conforto oferecido ao paciente. Os honorários tem o seu valor baseado na sua localização, oferta de serviços e formação técnica/científica, levando em consideração tabelas de honorários mínimos previstas pelos conselhos e entidades de classe que assistem aos dentistas.
5- Conexão Amazônia: O que você acha que pode ser feito para que a criança desde cedo seja incentivada a cuidar dos seus dentes?
Dra. Jacyara: Ensinar as crianças a escovar os dentes exige paciência e muita criatividade. A hora da escovação dental, normalmente, oferece muita resistência e isso pode se tornar uma constante dificuldade para os adultos. Muitos pais não sabem de que maneira resolver o dilema de como resolver esse dilema. Por mais trabalhosa que a tarefa de ensinar os pequeninos a ter hábitos de higiene bucal se revele, é necessário insistir nela. Pois a partir dos dois anos são criados os costumes que irão perdurar por toda a vida e os pais não devem desanimar diante do choro e da birra. Sabendo de todos os problemas que uma escovação inadequada pode ocasionar, tais como cáries, mau hálito e gengivite, os pais e responsáveis precisam encontrar a melhor maneira de estimular os filhos, tornando esse momento uma prática cotidiana divertida e não uma obrigação que cause sofrimento aos menores. Existem várias dicas valiosas que podem ajudar muito aos pais, normalmente é o Odontopediatra quem faz essas orientações. Vamos ver algumas dessas dicas: Um dos passos mais importantes para estimular as crianças a escovar os dentes é o próprio exemplo dos pais. É muito mais fácil para a criança entender que a escovação faz parte dos hábitos saudáveis quando ela cresce em um ambiente em que a família, logo após as refeições, escova os dentes, usa fio dental e higieniza a língua. A sugestão é que os pais escovem os dentes junto dos filhos, ao sair da cama e antes de se deitar. Vale também a criança escovar os dentes dos pais e vice-versa, o importante é demonstrar prazer pela escovação. Nessa hora, os pais devem aproveitar para checar se a criança está escovando os dentes de forma correta. Um ambiente adequado, como um espelho e um banquinho firme em vez de colocar a criança sobre o vaso sanitário. Outra opção é usar um copinho com água para a criança poder enxaguar a boca em vez de se esticar na pia para alcançar torneira. E os pais precisam ser firmes com as crianças, mas isso não significa irritação ou voz alta. É preciso explicar de forma carinhosa aos filhos que eles necessitam escovar os dentes. Uma outra boa tática também é incentivar as crianças com mecanismos de compensação, como prometer brincar com ela, contar uma história ou ouvir uma música depois de escovar os dentes. Assustar as crianças não é uma boa saída, elas poderão criar traumas que irão atrapalhar os bons hábitos em relação aos cuidados a saúde bucal. Muitos pais usam o dentista como uma figura má que tem um motorzinho capaz de torturar crianças desobedientes. Falar para a criança que vai levá-la ao dentista para tomar injeção é um erro, a cadeira de dentista é para tratar os dentes e deixar o sorriso mais saudável. Os pais também podem usar alguns artifícios como escovas de dentes coloridas, diversos cremes dentais infantis e historinhas específicas. A música e os livros sobre saúde bucal são também grandes aliados.
6- Conexão Amazônia: Em Ji-Paraná, podemos observar uma crescente quantidade de clínicas particulares, ainda é um bom investimento diante da concorrência? O que você acha disso?
Dra. Jacyara: Essa é uma dúvida de muitos profissionais dessa área. Muitos dentistas já saem do curso de Odontologia procurando meios de abrir um consultório particular. É claro que ao escolher esse tipo de atuação, muitas coisas devem ser levadas em consideração, em especial, a competitividade. Esse fator pode ser um dos maiores problemas para quem está começando, mas por outro lado, a grande quantidade de clínicas, indica a existência de um grande público. Há uma série de aspectos que devem ser pensados com cautela, mas com planejamento adequado e as parcerias corretas, esse é um negócio que vale a pena. Mas para adaptar-se a um mercado tão exigente, o cirurgião- dentista precisa atuar de forma administrativa, ter indicadores próprios, sistema de controle de qualidade, uma boa gestão financeira e investir no aprimoramento profissional. Comprovando que é viável empreender no ramo odontológico, existem muitos casos de sucesso.
Conexão Amazônia: Agradecemos a participação voluntária da Dra. Jacyara Soares em nos dar essas dicas valiosas e esperamos contar com sua colaboração todos os meses, para informações sobre saúde bucal para nossos leitores. Dra Jacyara, os nossos mais sinceros agradecimentos por sua participação!!!